Friday 27 June 2008

Finalmente: Rio das Flores

Li com grande interesse e ando a ruminar há meses nas famosas quatro páginas de Vasco Pulido Valente (VPV) no Público (27 de Novembro de 2007) sobre o Rio das Flores de Miguel Sousa Tavares (MST). Esta fascinante polémica mete claro livros, mas também curiosamente petiscos (já que VPV se inssurge contra o facto de MST fazer demasiadas descrições dos pratos ingeridos pelo protagonista, que são a seu ver injustificadas), sendo imperativo pois que este blogue se pronuncie sobre o tema.
Assim, plagiando a esquematização numérica do historiador VPV decidi dividir a minha própria criticazinha em três grandes vertentes:
1) Erros históricos: Antes de ter lido a crítica de VPV encontrei na blogosfera (um espaço irreal recheado de interessantes e divertidas surpresas) a crónica de Ricardo Araújo Pereira (RAP). Eu agora quero ser conhecida por CFW (Catarina Féria Walsh), acho que a sigla anima muito as controvérsias literárias, mas isto é apenas um aparte. RAP refere que MST escreve sobre o século XIX e o príncipio do século XX, “o que acaba por ser imprudente uma vez que Pulido Valente sabe mais sobre esse período do que as pessoas que o viveram, e irrita-se se alguém mexe na História de Portugal sem lhe pedir autorização.” Na minha modesta opinião, é importante que o romance histórico não contenha erros e anacronismos, mas é por isso que eu não gosto e raramente leio romances históricos. O tom, a linguagem, “a voz” da narrativa, o relacionamento entre as personagens, tudo me soa a falso. Quando estou numa livraria e pego num livro e na contracapa aparece uma sinopse absurda, normalmente apenas com um local e uma data: Veneza 1610...ou Londres 1897, ou Paris 1212...é o suficiente para eu o colocar logo na prateleira. Por exemplo, começei a ler um romance em cuja cena inicial há um camponês medieval que está repimpado debaixo de uma árvore a ler um livro (ou seja, não tinha morrido da peste negra, sabia ler, lia latim, não tinha nada que fazer nos campos, já que não tinha o senhor feudal à perna e ainda tinha conseguido arrastar o enorme e pesado livro da igreja ou mosteiro ou palácio, aberto o cadeado que muitos tinham e virado as suas páginas?) Inicialmente pode parecer que os erros históricos são de menosprezar e que é pretensioso exigir rigor, mas a verdade é que o Rio das Flores tem uma extensa biliografia e apregoa ser um romance histórico sério de enorme envergadura. MST avisa que não vale a pena procurar erros e que modificou apenas uma data para efeitos da intriga narrativa. Ora, o VPV não ficou convencido e com razão. As imprecisões confundem, distraem e impedem os leitores de aprenderem sobre o período histórico em causa (se é isso que querem e eu desconfio que seja). Mas não é isso que mais me preocupa, mas o modo atabalhoado como as explicações históricas são literalmente enfiadas no meio da acção de maneira quase incongruente. Surgem num tom didáctico e propagandístico e mesmo as opiniões das personagens sobre os acontecimentos que estão a ocorrer parecem ecoar mentalidades e atitudes que não se adequam à época em que vivem. As páginas com forte teor histórico são aborrecidas e aquelas que eu queria passar à frente para regressar à história, no sentido de conto, de intriga.
2) Intriga e personagens. Porque é que este livro capta o leitor e vende milhares, tornando-se um fenómeno literário? Não é por falar da política do Brasil, do caciquismo, da história do Tavares Rico ou simplificar o retrato de Salazar e o mesmo se pode dizer do Equador, mas por causa da intriga. A história é cativante, empolgante e isso seria quase suficiente para que o livro fosse um sucesso do ponto de vista literário se as personagens não fossem inconsistentes e lhes faltasse densidade, como apontou VPV. Apesar de não ser fácil simpatizar com a personagem principal, Diogo, um intelectual diletante com dinheiro e e sem rumo ao estilo de Carlos da Maia (mas com menos personalidade e carisma), o leitor quer saber o que vai acontecer a seguir. O irmão de Carlos, Pedro é fascista, de moralidade dúbia, embora seja mais real como personagem. Como saga familiar e no aspecto narrativo, e aqui discordo de VPV, o Rio das Flores funciona, mau-grado a flacidez de carácter das personagens. E isso, caros amigos, é fundamental num romance. Mesmo com o que VPV considera o tom de relatório e a “luz branca e monótona” da escrita de MST.
3) Mulheres. VPV ficou enfurecido com os erros históricos e com falhas literárias e só tocou ao de leve naquele que para mim é o ponto mais irritante do Rio das Flores, também visível no Equador (doutra maneira): As personagens femininas são amalgamadas ou estereótipos e tratadas como irrelevantes, com contornos pouco definidos. E isto a mim irrita-me tanto como a VPV o erro sobre a lei do morgadio. O livro falha do ponto de vista humano, porque a visão misógina de MST, tudo permeia. Para mim esta é uma questão central, de que pouca gente se apercebe porque as pessoas não vêem o mundo por esse prisma e estão habituados a ver as mulheres maltratadas, ignoradas, ridicularizadas e como diria "Gato Fedorento" "vilipendiadas" Além da dicotomia medieval da santa-prostituta, no Rio das Flores, as mulheres são comparadas a poltras e éguas, são apenas veículos de satisfação sexual, são equiparadas a prisões, a máquinas de produção de filhos, apesar de terem sempre a “anca esguia” têm usualmente o “seio farto”. Maria da Glória: a mãe de Diogo e Pedro é uma senhora conformista sem qualquer influência visível no marido ou nos filhos, sendo apenas respeitada e vista como a “santa mãezinha” típica dos machistas. A única coisa em que Maria da Glória tem poder é na gestão das tarefas domésticas. A sua viuvez prematura revolta-a, embora isso nunca se manifeste.
Maria do Amparo: começa por ser a mulher-selvagem, com sangue cigano e logo conotações equestres para depois se transformar na convencional esposa que nada mais quer que estar em casa aguardando o marido e tratando dos filhos. MST insua que Diogo perde o interesse porque ela, ao estar cansada por amamentar o bébé e ser praticamente uma criada, tendo o desplante de estar menos disponível para o sexo. Agarrada à terra, peixe fora de água em sociedade, pouco interessada em política ou em viajar é descrita como uma espécie de empecilho a Diogo, que por sua vez lê revistas estrangeiras, precisa de horizontes mais largos e de se descobrir a si próprio. Angelina: artista alentejana surge num campo, vinda do nada e começa um romance escaldante com Pedro, o irmão de Diogo, a despropósito que pinta nú, para depois ir para Paris. Porquê? Nada disto faz muito sentido, mas não é uma personagem credível. As suas opiniões políticas são pouco claras há algo da “mulher fatal” nela, que leva à perdição, da destruidora de corações, uma versão mais suave da inglesa do Equador.
A brasileira: Uma prostituta com que Diogo se vem a juntar, também com uma personalidade pouco marcante, mas com "contornos bem desenhados", ou seja mais um veículo para Diogo "se expressar". Neste caso ele apaixona-se pelo país, Brasil e não por ela.
Luisa: Para mim a personagem mais interessante mas ultra-secundária, casada com um amigo de Diogo, é uma mulher livre, moderna e diferente, activista política, que foge ao universo típico masculino com aspirações a Hemingway de MST: caça, touradas, idas às prostitutas.

Artigo de VPV
http://static.publico.clix.pt/docs/cultura/rioDasFlores.pdf

Wednesday 25 June 2008

Patos e ratos ou pactos e raptos

Hoje recebi mais um e-mail abaixo-assinado, petição ou indignação costumeira contra o controverso acordo ortográfico. Como se não existissem problemas mais graves no mundo (guerras, a fome, os preços do petróleo, o desemprego...) Se as pessoas se deixassem de nacionalismos e patriotismos rídiculos, xenófobos e de teor colonialista seria melhor. Ainda por cima há quem confunda alhos com bugalhos e esteja convencido que desde o momento em entrar em vigor o acordo, Portugal se vai afundar sobre o peso dos brasileirismos, fruto de quem se recusa a estudar os factos ou fatos (não resisto).
A última petição que recebi é sobre a "língua portuguesa, que é a nossa pátria" e que faz um trocadilho absurdo com pato: "De fato, este meu ato é devido à não aceitação deste pato com vista a assassinar a Língua Portuguesa." Que almas tão inseguras temem o assassinato de uma língua falada por um número estimado de 250 milhões de pessoas?
De qualquer modo, eis o que diz o odiado documento:

"a) Conservam-se nos casos em que são invariavelmente proferidos nas pronúncias cultas da língua: compacto, convicção, convicto, ficção, friccionar, pacto, pictural; adepto, apto, díptico, erupção, eucalipto, inepto, núpcias, rapto;

Morreram pelo menos 100 mil pessoas desde que começou a guerra no Iraque. Aliás não há sequer informação fidedigna de quantos civis foram mortos (cerca de quatro mil são soldados americanos). Não será muito mais grave nem sequer termos acesso a essses dados e centenas de milhares morrerem num conflito absurdo...ou talvez seja preferível gastar energias a defender a ortografia da palavra "acto".

Monday 23 June 2008

O mundo da moda



Na semana passada fui à abertura da exposição “Little Black Dress” no Museu da Moda sobre esse clássico do guarda-roupa feminino que é o vestido negro. O Museu, sediado num antigo armazém industrial foi fundado pela estilista excêntrica e meia “punk” Zandra Rhodes. A minha amiga Mary-Jane fez chapéus para vender na loja do museu e vai apresentar um “workshop” em que ensina pessoas a fazer um exemplar com os materiais que ela leva e as técnicas que partilha. A isto, chama ela “mobile Millener”, ou seja a chapeleira ambulante.
Encontrámo-nos à porta e Mary Jane além de usar uma das suas criações (pétalas de tecido sobrepostas num efeito “vintage” entre a touca e o chapéu) vestia meias pretas sem pés, uma túnica preta com um cinto largo vermelho, diversas pulseiras de plástico coloridas e sapatos pretos com pom-poms (o look londrino entre o “retro” e o último grito da moda define a Mary Jane).
A festa foi bem regada com champanhe e os vestidos pretos estavam expostos em grupos conforme as épocas, começando com um exemplar Chanel, já que foi Coco Chanel quem lançou a moda do vestido preto nos anos 30, estipulando que este (junatamente com bujuteria falsa)devia ser o uniforme da mulher moderna. Desde essa altura o vestido preto aparece sob as mais diversas formas. Algumas das peças expostas eram obras de arte, saídas dos filmes da Audreey Hepburn ou Grace Kelly, cinturas minúsculas e drapeados em seda e tafetá. Outros eram absurdos robes de plástico, mais gabardine que vestido, cravados a metal ou horrendos tubos de lycra co,m ombreuiras gigantes dos anos 80.
Zandra Rhodes abriu a exposição com a sua imagem de marca: cabelo cor de rosa, sombra azul nos olhos (tipo panda) e uam sobreposição de roupas assimétricas. A convidada de honra era a modelo Erin O´Connor que é conhecida por ter transformado a imagem do Marks and Spencer de loja para tias octagenárias em catedral da moda. Não aconselho ninguém a colocar-se ao lado deste cisne cujo pescoço é maior do que a minha altura...quase...altissima, esguia e esquelética, esta modelo tem um ar inteligente, com o cabelo curto preto, um estilo andrógino e uma voz e sorriso agradáveis, mas é intimidante, coma sua altura, de tal maneira que a pobre da Zandra Rhodes que também é diminuta lhe pediu para tirar os sapatos. A fauna era composta de mulheres em vestidios pretos, com a suas próprias versões da elegância. Era óbvio que muitas faziam o chamado “channeling”, ou seja copiar uma actriz, usando esse “look” como “canal”. Não é a linguagem da moda absolutamente absurda? Contudo, é divertida e leve. Expliquei a um amigo meu no outro dia que a moda é a única coisa que interessa no “Sex and the City”, que acho machista e com mensagens seriamente duvidosas de consumismo galopante, imoralidade, leviandade e conformidade com papéis tradicionais (apesar das conversas sobre vibradores e dating compulsivo). A mesma pessoa referiu “a minha ex-mulher deixou-me para ir viver a vida do Sex and the City”. O que será que quer isto tudo dizer? Quando vir o filme voltaremso a esta vaca fria.
Na exposição do vestido negro, explicava eu que as mulheres estavam de negro, alguns poucos homens acompanhavam-nas com cara de querer estar a ver o Euro 2008 (os tais estereótipos) e outros “gays” estudantes de estilismo deleitavam-se. Um Travesti com pernas muito magras, mini-saia e saltos altos, mas de cabelo curto rapado cantou sobre a importância de ter um vestido preto. Na loja várias pessoas experimentavam os chapéus da Mary Jane sem comprar, o que a levou a questionar Zandra Rhodes e um rapaz chamado Piers sobre a dificuldade de vingar no mundo cruel da moda. Na sua pronúncia “cockney”, a estilista aconselhou-a a não desistir. Ela argumentou que tinha 40 anos e que estava a peder a esperança. Eu eo Piers insistimos que ela tinha uma aparência ultra-jovem.

Friday 20 June 2008

A vida depois de Hillary

Depois da desistência de Hillary Clinton, o Partido Democrata quer apenas mostrar uma frente unida e esperar que a "Obama-mania" não dê lugar à fadiga face a um candidato que é quase "bom demais para ser verdade". E quem será número 2? Al Gore demorou até vir a público apoiar Obama, mas está claramente a fazer-se ao lugar...