Thursday, 24 July 2008

A obsessão com a propriedade






Basta pegar num livro da Jane Austen para nos apercebermos imediatamente do pragamatismo e da obsessão britânica em torno da propriedade e dos rendimentos anuais dos potenciais maridos das heroinas destes divertidos e sagazes romances.
A angústia em torno da compra, aluguer, negócios, especulação imobiliária tem-se intensificado com um mercado pouco regulado e em que os preços aumentam de ano para ano, até a actual crise ter abanado os alicerces da nação.
Durante uma década de lucros no sector imobiliário que enriqueceram muitas almas da classe média, as festas e jantares pelo Reino fora são passados a debater os preços das casas, as taxas de juro, os vários planos para rentabilizar patrimónios imobiliários.

Os canais de televisão estão repletos de programas sobre casais à procura da sua "casa de sonho", como fazer obras para aumentar o valor dos apartamentos ou moradias ou possíveis investimentos em casas compradas para alugar. Normalmente os apresentadores, que se tornam celebridades no circuito da "reality TV" tratam os participantes como tontos e aconselham-nos a endividarem-se para adquirirem propriedades que na verdade não têm dinheiro para comprar.

Por causa dos preços excessivos, a maioria das pessoas não consegue comprar casa até ter 30 e tal anos, aspirando a conseguir entrar na chamada "property ladder", as escadinhas em que se compra a primeira casa, para vender, para re-hipotecar, para usar o dinheiro que se fez para comprar uma casa maior e mais cara, isto de dois em dois anos. Cansativo, não?
Apesar das raízes centenárias desta obsessão, a realidade ditava que até à II Guerra Mundial, só 10% da população era dona da casa onde vivia. A nível social, arrendar não era visto como a quase vergonha social que é hoje, em que existe um estigma.


No fim dos anos 40 e nos anos 50, o esforço de reconstrução resultou em casas novas mais acessíveis à classe média e foi então que a compra da propriedade imobiliária se tornou num objectivo de ascensão social, uma bitola pela qual se avalia o sucesso dos indivíduos.


Foi com Margaret Thatcher nos anos 80 e a politica do "direito à compra de casa" para inquilinos de casas pertencentes às autoridades locais que esta tendência se solidificou, juntamente com medidas posteriores de benefícios fiscais para proprietários.


Cerca de 70% dos ocupantes de casas no Reino Unido são senhorios. Muitas dos apartamentos que estão a ser construídos são concebidos como investimentos para o mercado da compra para arrendamento, ou seja não são pensados para famílias e como locais para viver. Só que uma casa é muito mais do que um tecto e quatro paredes.

Numa sociedade consumista, endividada que promove a ideia de que toda a gente pode ser milionária com esquemas e planos para enriquecer rapidamente não é de estranhar que um dos casos mais absurdos e chocantes tenha ido esta semana a julgamento em Inglaterra.

John e Anne Darwin de 57 e 56 anos que investiram em vários apartamentos, ficaram sobrecarregados de dívidas e então decidiram simular a morte dele numa acidente de canoagem (o absurdo de toda esta história é tal que não poderia ter sido ficcionada). John Darwin viveu escondido durante cinco anos, enquanto a mulher fazia o papel de viúva inconsolável, inclusive perante os dois filhos adultos do casal que pensavam que o pai tinha morrido. Anne conseguiu centenas de milhares de libras em apólices de seguros e fundos de reforma. O objectivo do casal Darwin era mudar-se para o Panamá (mais um detalhe absurdo) e montar um centro de férias ecológico de canoagem. Infelizmente o plano que saiu daquelas cabeças brilhantes tinha várias falhas e como criminosos amadores que eram, John e Anne fizeram diversos erros. Ele tinha se entregado à polícia fingindo que estava a sofrer de amnésia (ao estilo de Matt Damon em Bourne Identity) para poder usufruír das riquezas que a morte simulada lhe tinha trazido.

A sentença do casal Darwin foi seis anos de prisão por fraude e lavagem de dinheiro. Além dos investimentos imobiliários, um dos planos deste Bonnie e Clyde de meia-tijela era fundar um negócio de criação de caracóis...

Wednesday, 9 July 2008

Acerca dos efeitos terapêuticos dos doces e compotas

Mais um verão chuvoso em Londres e as amoras do jardim crescem como se tivessem bebido um líquido mágico, atrofiando tudo o que se atravesse no seu caminho. A nossa melhor colheita deste ano (no ano passado tivemos uma produção absurda de courgettes gigantes, que pareciam abóboras verdes) é ideal para fazer doces, uma nova actividade que recomendo pelas suas indicações terapêuticas.
As compotas (com mel em vez de acuçar) já tinha feito com bons resultados e lá voltarei com uma nova receita inventada e óptima para adoçar cereais de pequeno almoço e iogurtes.
Este doce the amoras é muito fácil e envolve apenas o seguinte:

Ingredientes:

1 quilo de amoras
1 quilo de acuçar

Método:

Primeiro esterilizam-se os frascos (fervidos ou postos em forno frio durante 20 minutos. Não se esqueçam das tampas). Eu usei frascos de azeitonas, mayonnaise e outros muito bem lavados e com as etiquetas tiradas).
Numa panela põem-se as amoras e vai se deitando o acuçar, mexendo bem. Quando o caldo começa a ferver, deve-se ir tirando a “espuma” que fica por cima. O doce coze em 20 minutos em lume brando e depois aumenta-se o calor durante 5 ou 10 minutos no fim, para nos livramos de impurezas e da tal espuma. Cola-se nos frascos secos e num armário fechado. Quando abertos, devem ser conservados no frigorífico.

Não há nada como scones caseiros com natas e doce de amora, uma tradição estival inglesa, enquanto se bebe chá ou champanhe e se assiste ao campeonato de ténis de Wimbledon.

Tuesday, 1 July 2008

O centro ou o abismo para quem quer ser um reformador?




Como nunca fui apoiante incondicional de Obama não me supreende nem me desilude por aí além que ele tenha mudado de ideias numa série de políticas, na ânsia sôfrega de captar votos e mostrar-se um candidato mais moderado e do "centro". É isso que faz a maioria dos políticos. O problema é que Obama é supostamente diferente e um reformador, capaz de galvanizar o povo e inspirar a nova geração.

Quando ninguém sabia quem ele era, o senador de Illinois defendeu que as campanhas partidárias deviam ser financiadas pelos cofres públicos e que deviam ser estabelecidos limites claros ao angariamento de fundos. Agora, como candidato do Partido Democrata e o político que mais dinheiro conseguiu arrecadar na história das campanhas políticas norte-americanas, Obama decidiu que as contribuições privadas e sem limites fixos são perfeitamente aceitáveis.

Mais grave é o facto de Barack Obama ter voltado atrás em posições como o controlo das armas de fogo e a oposição à pena de morte, assuntos que mostravam as suas credenciais progressistas. A questão é que a direita conservadora nunca vai votar nele e os milhões que o idoltram pelo que ele representa (ou a ideia abstracta do que acreditam que ele simboliza) o seu carisma, capacidade de inspirar gente apolítica vão ficar cada vez mais desiludidos. A estratégia da "moderação", se é isso que significa a pena de morte, não funcionou para Al Gore, nem para John Kerry...