Thursday 15 January 2009

Maternidade-novo desporto competitivo

Um artigo de opinião publicado no Times de hoje irritou-me de tal maneira que decidi escrever aqui sobre o controverso e muito debatido tema da maternidade e o mercado de trabalho.
Tudo veio a propósito da ministra francesa da justiça, Rachida Dati que regressou ao trabalho após cinco dias depois de ter tido um bébé por cesariana. (Acho muito mais chocante que o ex-Primeiro ministro espanhol José-Maria Aznar possa ser o progenitor! )
De qualquer modo, o caso da super-ministra que apareceu magra e de saltos altos na reunião do executivo Sarkozy logo depois de ter tido o bébé inspirou uma senhora chamada Michelle Mone, que fundou e é directora duma empresa de "lingerie" a escrever o tal artigo. Michelle explica que a ministra foi obrigada a regressar ao trabalho imediatamente e que ela fez o mesmo. Porquê? porque tinha um negócio a gerir e para tal deu instruções ao marido e ao resto da família para tomarem conta da bébé. Esta interferiu com os planos do lançamento dum novo "soutien" da sua empresa e Michelle sentiu-se culpada, mas escolheu avançar com o negócio e esconder de quase toda a gente que tinha tido uma filha. A empresária dá a entender que o marido lhe deu muito apoio, embora a relação tenha sido afectada: " It affects your relationship with your husband because you have so many tasks to do that you've no time whatsoever; you don't want to be even in the same room as him."
Contudo, o mais peocupante para mim é a parte em que ela diz gerir a casa como um negócio: "My staff, the kids and my husband have key performance indicators and every Friday we get together with a flip chart and mark how the week has been."
Ou seja, a senhora está tão ocupada que nem quer ver o marido e trata a família como os empregados da empresa, com reuniões e avaliações da "performance".
Enquanto a motivação da ministra francesa e também de Sarah Palin, a candidata republicana (no escritório três dias após o parto-tempo recorde!) é a ambição politica e de avanço de carreira, a de Michelle é de ordem profisisonal, mas principalmente económica. Para ela é crucial ganhar dinheiro e que as suas crianças possam estudar em colégios privados e com um nível de vida bom.
Esta pressa em regressar ao trabalho e em retomar a carreira tem sido atacada na imprensa, tanto por conservadores tradicionalistas em defesa da família e da natureza "sagrada da maternidade" como por feministas que acham que as mulheres devem ususfruir dos direitos que conquistaram, como a licença de parto.
Para mim existem duas questões:
1-As mulheres devem ter o direito a escolher e a não serem julgadas e crucificadas (mesmo a Sarah Palin) por quererem ou terem que trabalhar, por não quererem amamentar, por terem pouco tempo para os filhos, por não se adequarem a uma imagem da "mãe e dona de casa perfeita".
2-Por outro lado, é lamentável que vivamos numa sociedade que as mulheres não podem ser mulheres e estar grávidas e ter filhos e tomar conta deles, sem terem que adoptar atitudes masculinas para serem respeitadas e ganharem credibilidade profissional. Ou seja, as características femininas têm que ser suprimidas (a própria Palin também escondeu a última gravidez durante 7 meses). As mulheres não podem ser emocionais ou chorar ou serem "hormonais". Por isso é comum mulheres em posições de poder serem extremamente rígidas e intolerantes face a outras mulheres. Uma colega gestora na minha empresa que tem uma filha disse que não gostava de contratar mulheres com crianças e que não lhes dava qualquer flexibilidade.

No Reino Unido, em que a lei estipula que a entidade empregadora tem que pagar apenas 90% do salário durante seis semanas, em que existe muito pouca flexibilidade para mães que trabalham e em que as creches custam os olhos da cara, a maternidade não é valorizada, quando muito é santificada dum modo irrealista.
O que as mulheres não percebem é que são elas que se têm que respeitar a si próprias e respeitar as escolhas das outras mulheres, sem perder de vista a construção dum sistema mais justo. Talvez assim, possamos escapar ao individualismo, egoísmo, materialismo e concorrência desenfreada dum modelo social tipicamente masculino em que o trabalho e o lucro se sobrepõem às relações familiares e à solidariedade social.
A feminista Germaine Greer disse: "se a igualdade significa o direito a partilhar os lucros da tirania económica, é incompatível com a emancipação. Liberdade num mundo que não é livre é apenas uma luz verde para a exploração".
O mesmo se pode dizer da maternidade. A utopia é que as mulheres recebam salários iguais aos homens, que ser mãe, trabalhadora ou não, seja uma actividade a que é dado o devido valor e não "masculinizada" e tornada um desporto competitivo.

http://women.timesonline.co.uk/tol/life_and_style/women/families/article5518256.ece

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